O avanço tecnológico trazido pela inteligência artificial tem transformado diversos setores, incluindo o sistema judiciário. A utilização dessas ferramentas para apoiar juízes na elaboração de decisões judiciais promete agilidade e eficiência, mas também levanta preocupações significativas. Muitas das dificuldades já existentes no meio jurídico, como a desigualdade, a falta de transparência e o risco de vieses, podem ser agravadas quando essas tecnologias são implementadas sem critérios rigorosos. Isso evidencia que o progresso tecnológico nem sempre é sinônimo de soluções definitivas para problemas históricos.
O emprego da inteligência artificial como suporte na confecção de sentenças busca otimizar o trabalho dos magistrados, acelerando o processamento de processos e reduzindo o acúmulo de casos. No entanto, a dependência excessiva desses sistemas pode levar à automatização de erros, tornando-os mais difíceis de detectar e corrigir. O desafio está em garantir que essas ferramentas complementem, e não substituam, o julgamento humano. Caso contrário, questões antigas relacionadas à justiça podem ser perpetuadas, ou até mesmo aprofundadas, gerando uma falsa impressão de eficiência.
Outro ponto delicado é o viés algorítmico, que surge quando os dados usados para treinar sistemas de inteligência artificial refletem preconceitos históricos e sociais. Isso significa que as decisões geradas por esses sistemas podem reproduzir discriminações já presentes no sistema judicial, afetando negativamente minorias e grupos vulneráveis. A falta de diversidade nas bases de dados utilizadas para o aprendizado dessas tecnologias é um problema grave, que exige atenção e ações preventivas para evitar a amplificação de desigualdades.
Além disso, a transparência na tomada de decisões assistidas por inteligência artificial é uma questão complexa. Diferentemente dos juízes humanos, que podem explicar suas motivações, os sistemas automatizados geralmente funcionam como “caixas-pretas”, dificultando o entendimento dos critérios usados para chegar a uma determinada sentença. Essa opacidade pode minar a confiança da sociedade no sistema judiciário, uma vez que os cidadãos têm o direito de compreender como e por que suas causas são decididas.
A implementação dessas tecnologias no Judiciário brasileiro deve, portanto, ser acompanhada de regulamentações específicas que garantam o uso ético e responsável. O treinamento contínuo dos profissionais envolvidos, a revisão constante dos sistemas utilizados e o desenvolvimento de mecanismos que permitam auditorias independentes são medidas fundamentais para minimizar os riscos associados. Sem esses cuidados, a inovação pode acabar comprometendo a credibilidade e a efetividade da Justiça.
Outro aspecto que merece destaque é a resistência cultural à adoção de tecnologias avançadas no ambiente jurídico. Muitos profissionais temem que o uso da inteligência artificial possa enfraquecer o papel do juiz, reduzindo a análise subjetiva e o discernimento crítico que são essenciais para a justiça. No entanto, a ideia central não deve ser substituir o trabalho humano, mas sim aprimorá-lo, integrando a tecnologia como ferramenta para apoiar decisões mais fundamentadas e menos suscetíveis a erros.
Vale lembrar que o sistema judiciário já enfrenta desafios históricos, como morosidade e falta de acesso para parcelas da população. A inteligência artificial pode ser uma aliada importante para mitigar esses problemas, desde que utilizada com responsabilidade. A tecnologia, por si só, não resolve questões estruturais, mas pode colaborar para a criação de um ambiente mais justo e eficiente, desde que suas limitações sejam reconhecidas e enfrentadas.
Por fim, o debate sobre a adoção de inteligência artificial no âmbito judicial reforça a necessidade de reflexão crítica e envolvimento da sociedade. O uso de tecnologias inovadoras não pode ser encarado como um fim em si mesmo, mas como parte de um processo contínuo de melhoria da justiça. É fundamental que o desenvolvimento e a aplicação dessas ferramentas estejam alinhados com princípios éticos e valores democráticos, garantindo que o direito à justiça seja preservado e ampliado para todos.
Autor : Mondchet Thonytom